quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Editorial do Página 13 de Fevereiro


O melhor ainda está por vir

No dia 10 de fevereiro de 2014 o PT comemorou 34 anos. A data foi motivo de festejo em todo o país. E com razão. Apesar dos caminhos tortuosos, dos momentos difíceis, dos erros, derrotas e decepções, predominam as razões para termos orgulho do PT.

Em ato organizado pelo Diretório Nacional e realizado no Anhembi, São Paulo, as lutas pelo fim da ditadura militar, pela democracia, pelos direitos dos trabalhadores, pela soberania nacional e pela igualdade foram lembradas.

Mas quem prestou um pouco mais de atenção conseguiu perceber que nessa construção da memória e do significado de nossa trajetória partidária realizou-se um duplo movimento.

Por um lado, buscou-se projetar no presente lutas e bandeiras que, na verdade, com o tempo, ficaram no passado. Afinal, não podemos mais afirmar que hoje o PT combate a forma tradicional de fazer política tal como combatia antes. Muito daquilo que condenávamos nos outros, passou a fazer parte de nosso cotidiano. Qualquer análise minimamente séria sobre o modo como vem acontecendo o Processo de Eleições Diretas do PT (PED) reconhece que foi incorporado e generalizado no interior do partido práticas degeneradas de manipulação política, próprias das democracias liberais burguesas.

Por outro lado, tentou-se projetar no passado lutas e bandeiras que, na verdade, surgiram posteriormente e passaram a fazer parte do presente. Afinal, o que hoje se chama luta pela “cidadania”, antes se chamava luta pelo “fim da exploração”; o que hoje se chama “criar oportunidades para todos”, antes se chamava “acabar com as desigualdades”; o que hoje se chama “desenvolvimento com inclusão”, antes se chamava “programa democrático-popular”; o que hoje se chama “construir um país de classe média”, antes se chamava “construir um país socialista”.

Aparentemente, os dois movimentos são contraditórios: enquanto um traz o passado para o presente, o outro leva o presente para o passado. Porém, ambos compõem um mesmo esforço retórico de afirmar que, apesar de todas as mudanças, ainda somos os mesmos.

Ao optar pela ênfase na continuidade, não na transformação, e ao deixar de indicar precisamente o que sofreu mudança e o que permaneceu o mesmo no PT, o sentido geral do ato parte de um pressuposto falso e tem uma orientação política implícita: o desafio dos próximos anos é fazer a mesma coisa que fizemos nos últimos 34.

Ao defender o partido e o governo dos ataques de quem considera esgotado o ciclo do PT no Brasil, Dilma afirmou que o “modelo” adotado nos últimos 11 anos mostrou que funciona bem tanto em épocas boas quanto em épocas más. Com outras palavras, a presidenta disse que o modelo não precisa de ajustes, pois é muito versátil.

Mas diante disso, surgem algumas questões. Mantido inalterado, será que este projeto “ainda tem muito o que render para a juventude e as próximas gerações”, como afirmou Fernando Haddad? O modelo, tal como está, é capaz de “aprofundar as reformas democrático-populares”, como enfatizou Emídio de Souza? Sem mudanças, seria possível um segundo governo Dilma “com novas e maiores conquistas para o povo brasileiro”, como defendeu Rui Falcão?

Rui Falcão acertou quando afirmou que nas Jornadas de Junho o povo clamou por mudanças, mas por mudanças com Dilma; assim como acertou a própria presidenta ao dizer que no ano passado “ninguém pediu pra voltar pra trás”. Contudo, não se extraiu desta análise todas as suas consequências, a saber: se quiser realizar as mudanças profundas que o povo deseja, o PT não pode ficar refém do mero continuísmo.

Primeiro, porque se o modelo foi construído tendo em vista um país de classe média, para quem os serviços de saúde, educação, segurança e transporte são obtidos na iniciativa privada, então dificilmente ele servirá para construir um país em que as políticas sociais e os serviços públicos são gratuitos, universais e de qualidade para todos.

Segundo, porque a resolução dos problemas evidenciados pelas Jornadas passa pela realização de reformas estruturais (política, tributária, urbana, agrária etc.) e pela democratização da comunicação, o que exige um grau de enfrentamento com interesses das classes dominantes que o modelo atual não é suficientemente versátil para promover e suportar.

O que o PT já fez é suficiente para nos orgulharmos. Mas, como um mantra contra a soberba, durante o ato se falou reiteradamente que ainda temos muito o que fazer e que o que fizemos foi só o começo.

Portanto, o melhor ainda está por vir. Resta saber se será suficiente traçar uma linha de continuidade entre o passado e o futuro ou se o presente está nos exigindo mais do que o nosso passado pode oferecer.

Os editores & Rodrigo Cesar


Página 13

Nenhum comentário:

Postar um comentário