quinta-feira, 26 de junho de 2014

Resolução da AE sobre conjuntura

A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, reunida no dia 20 de junho de 2014, debateu a conjuntura, as eleições 2014, as tarefas do Partido dos Trabalhadores e da militância da Articulação de Esquerda.

No dia 21 de junho ocorreu a convenção que lançou oficialmente a candidatura da presidenta Dilma Rousseff à reeleição. Durante a Convenção, assistimos aos discursos de Rui Falcão, Lula e Dilma Rousseff, que confirmaram aspectos importantes das conclusões a que chegamos na reunião da direção nacional da AE.

Levando em consideração a repercussão da Convenção e o que foi debatido dia 20 de junho, a direção nacional da Articulação de Esquerda divulga a seguinte orientação militante:

1. A militância da AE deve jogar todos os seus esforços, no próximo período,  na reeleição de Dilma Rousseff presidenta.

2. Cabe a cada direção estadual, coordenação setorial, organização de base e a cada militante individual decidir como combinar esta prioridade com nossas demais tarefas, entre as quais destacamos: a plenária estatutária da CUT (28/7 a 1/8), a jornada de formação no Ceará (28/7 a 3/8), a organização do Plebiscito Popular (2 a 7/9) e a campanha de nossas candidaturas.

3. As eleições de 2014 ocorrem num contexto marcado por três grandes variáveis:

a) o aprofundamento da crise internacional e, por decorrência, maior pressão das potências imperialistas sobre a América Latina e o Brasil;

b) o acirramento da disputa entre as duas vias de desenvolvimento do Brasil, com o grande empresariado e parcela dos “setores médios”, a oposição de direita e o oligopólio da mídia deixando claro sua aversão radical a toda e qualquer medida vinculada a soberania nacional, a integração latino-americana e caribenha, a ampliação das liberdades democráticas, ao bem estar social e a igualdade;

c) a ampliação da parcela da população e do eleitorado oriundo da classe trabalhadora que mantém reservas ou até mesmo desconfiança frente ao petismo e frente ao lulismo;

4. Frente a este novo cenário, cresce a necessidade de que o Partido dos Trabalhadores dê um salto na sua capacidade organizativa, política, teórica, cultural e estratégica.

5. Parcelas importantes e crescentes da base social, eleitoral e militante do Partido reclamam da direção que seja capaz disto. Mas o grupo majoritário na direção nacional do PT não revelou, até o momento, disposição e/ou capacidade para mudar os rumos e os métodos de atuação, mudança essencial para enfrentar a nova situação estratégica aberta pelos realinhamentos no empresariado e na classe trabalhadora.

6. A variável central da conjuntura é a radicalização da direita. Um exemplo disto é a postura adotada frente à Copa do Mundo. As oposições (tanto a de direita quanto a de esquerda) buscaram politizar ao extremo o tema, tendo adotado em alguns casos o slogan “não vai ter Copa” e de fato torcendo pelo fracasso do certame e da seleção brasileira em campo, deixando ao PT e ao governo a defesa dos “interesses nacionais”.

7. Por qual motivo as oposições agiram assim? Para além de análises e opções táticas, há uma razão estratégica de fundo: depois de quase 12 anos de presidência petista, houve mudanças importantes no país e por isto mesmo parcelas crescentes da população estão insatisfeitas.

8. De um lado, o grande empresariado e os “setores médios tradicionais” (assalariados de alta renda, assim como setores da pequena burguesia) estão insatisfeitos com as mudanças ocorridas, querem evitar seu aprofundamento e querem recuperar o espaço perdido.

9. De outro lado, amplos setores da população trabalhadora e parcelas dos “setores médios” estão também insatisfeitos, não com o sentido das mudanças, mas sim com a timidez das mudanças realizadas e querem ganhar mais e mais rápido.

10. Este desejo por mais mudanças é visível, com maior ou menor clareza, nas jornadas de junho de 2013, nas greves de diversas categorias e também na mobilização dos sem-teto.

11. A “oposição de esquerda” gostaria de aproveitar este cenário. Mas a radicalização da direita, internacional e nacional, contra o PT vem fechando os espaços para a “oposição de esquerda”, que mesmo contra sua vontade tende a converter-se em linha auxiliar da direita, do grande capital e do imperialismo. É preciso explicar isto pacientemente, mas com palavras claras, para os militantes de outros partidos e organizações que insistem neste caminho; e é preciso disputar sua base social, que inclui setores da classe trabalhadora que na ausência de uma alternativa de esquerda podem cair na desmoralização ou inclusive girarem à direita.

12. A oposição de direita também conhece o desejo popular por mais mudanças e sabe que só ganhará as eleições presidenciais se conseguir aparecer, para a maioria do eleitorado, como a portadora de mudanças. Acontece que existe uma contradição antagônica entre a mudança desejada pelo povo e a mudança desejada pela oposição de direita.

13. As mudanças desejadas pelo povo, nós traduzimos em mais Estado, mais desenvolvimento, mais políticas públicas, mais emprego, mais salário, mais democracia.

14. Já a mudança desejada pela oposição de direita implica em desemprego, redução de salários, menos direitos, menos políticas sociais e democracia: é uma mudança para pior.

15. Por isto, a oposição de direita não pode assumir abertamente seu programa, não pode dizer que tipo de mudança deseja para o país. Dizer que vão gerar desemprego, reduzir salários e investimentos sociais seria a derrota antecipada.

16. Sem poder falar do futuro que pretendem construir e sem poder falar do seu próprio passado -- quando implementaram no Brasil o programa neoliberal -- o que resta para a oposição de direita é criticar “tudo isto que está aí”, combinando a denúncia de problemas (reais ou não), a manipulação midiática e a sabotagem ativa, para criar um ambiente de crise, deterioração e caos.

17. Por isto o oligopólio da mídia anda tão crítico quanto à realidade brasileira. Por isto falaram que “não vai ter Copa”, por isto torceram abertamente para que ocorresse algum desastre que prejudicasse a competição, por isto tentaram (ainda que sem sucesso) “capitalizar” os xingamentos à presidenta no jogo de abertura, pois tudo isto reforça o ambiente negativo do qual se nutrem as candidaturas da oposição de direita.

18. Agora, que a Copa já está em curso, a oposição tenta se reposicionar. Seja por razões comerciais, seja por razões políticas, o consórcio entre os partidos de oposição e o oligopólio da mídia não pode assumir abertamente sua torcida pela derrota do Brasil. Mas não faz autocrítica e, tendo oportunidade, voltará à posição original, de torcer pela derrota e pelo desastre.

19. A radicalização da direita abrange todos os cenários e temas. A violenta reação contra o decreto acerca da participação social, acusando o PT de “bolchevismo” e a participação de “soviética”, é de um didatismo total: a direita brasileira considera qualquer reforma uma revolução; e, por isso, contra qualquer reforma ela uiva por um golpe preventivo (a “contrarrevolução”).

20. Frente a este cenário, a maioria da direção do nosso Partido age como se ainda fosse possível adotar a tática de 2002.

21. Nunca apoiamos aquela tática, mas reconhecemos que em 2002 a tática de centro-esquerda era eleitoralmente “lucrativa”. Hoje é diferente: as alianças com setores da direita, as expectativas na postura do grande empresariado, a tibieza frente ao oligopólio da mídia, a moderação programática geram rendimentos eleitorais decrescentes.

22. Portanto, para além do erro estratégico contido nas atitudes citadas no ponto anterior, há um erro tático: este caminho não é adequado para vencer as eleições de 2014, nem nacionalmente, nem nos estados.

23. A radicalização da direita (e não apenas da oposição de direita) e a ofensiva do grande capital não dão margem para a reprodução da tática adotada em 2002.

24. Aliás, já em 2006 nossa tática foi distinta daquela adotada em 2002, graças ao que obtivemos em 2006 uma vitória eleitoral, política e ideológica. Já a tentativa de reproduzir, em 2010, a tática de 2002, resultou numa vitória eleitoral, mas num ambiente de defensiva política e ideológica.

25. Não se trata apenas de escolher a melhor tática para ganhar a eleição de 2014. Se trata, também, de escolher uma tática que tenha melhores repercussões estratégicas.

26. Lula fez um segundo mandato superior ao primeiro. Graças a isso, não apenas o povo melhorou de vida, mas também Dilma foi eleita em 2010. Analogamente, se a esquerda quiser continuar governando o país a partir de 1 de janeiro de 2019, é indispensável que o segundo governo Dilma seja superior ao primeiro.

27. Mesmo que Dilma vença as eleições presidenciais de 2014, a oposição de direita não vai deixar de existir. Pelo contrário, vai continuar com suas duas táticas: por um lado preparando-se para as eleições presidenciais de 2018, por outro lado trabalhando para impor a política deles ao segundo governo Dilma. Isto fica claro no discurso sobre a suposta inevitabilidade de um “ajuste” em 2015, ganhe quem ganhar.

28. De nossa parte, não basta vencer as eleições presidenciais. O segundo mandato Dilma só terá a força necessária para fazer mudanças estruturais no país, se conseguir combinar vitória na eleição presidencial, ampliação da presença institucional da esquerda (no parlamento nacional, nos parlamentos e governos estaduais), aliança com os movimentos sociais e partidos de esquerda, com democratização da comunicação social e uma reforma política ampla, feita através de uma Constituinte Exclusiva.

29. Por isto, consideramos fundamental o engajamento do Partido na luta pela reforma, pela constituinte e na realização do plebiscito popular.

30. Neste sentido, reiteramos nossa defesa da impugnação da candidatura de Candido Vaccarezza a deputado federal pelo estado de São Paulo. De forma geral, o Partido deve ser duro com personagens deste jaez, que como André Vargas e Luiz Moura, integram a quinta coluna da direita no interior de nossas fileiras.

31. Na luta política contra o PT, a oposição de direita usa e abusa das insuficiências e contradições do governo e do próprio Partido. Por exemplo, a incompreensão acerca do papel do grande capital.

32. Como já dissemos várias vezes, o grande capital não é “ingrato” nem “desinformado”, apenas sabe que certas intenções que manifestamos, certas opções que fizemos e os êxitos que acumulamos, são incompatíveis com o padrão de acumulação hegemônico no grande empresariado brasileiro.

33. Dizendo de outra maneira, o atual padrão de acumulação do grande capital necessita da perversa combinação de desemprego e salários baixos, com preços e juros altos.

34. Desta incompreensão acerca da postura do grande capital, decorre a incorreta insistência numa política de alianças do PT com setores da direita política e social.

35. Em nossa opinião, para manter o eleitorado de esquerda e disputar o eleitorado de centro, precisamos demarcar claramente com as posições da direita, apontando o que eles fizeram, o que nós fizemos e principalmente dizendo o que faremos no próximo mandato.

36. Outra incompreensão existente no nosso Partido diz respeito ao papel, que reputamos positivo e indispensável, dos movimentos e das lutas sociais, para nossas vitórias eleitorais e principalmente para o êxito dos nossos governos.

37. Entre as incompreensões destacamos, ainda, a que leva setores do PT e do governo a não compreenderem a urgência inadiável da reforma política e da democratização da comunicação; bem como aquela que insiste em chamar de "classe média" os setores da classe trabalhadora que, graças a nossas políticas, ampliaram sua capacidade de consumo.

38. Para ganhar as eleições de 2014, precisamos não apenas manter conosco o “núcleo duro” do nosso eleitorado, mas conquistar os setores populares que mantém ou desenvolveram desconfianças, dúvidas e insatisfações frente a nós.

39. Para isto, não basta falar do presente nem do passado. É preciso falar do futuro.

40. Em primeiro lugar, porque o atendimento das necessidades básicas de expressivas parcelas de setores antes marginalizados fez surgir demandas reprimidas que antes não tinham sequer a oportunidade de se apresentar.

41. Em segundo lugar, porque o difuso desejo de mudanças indica que a maioria da população quer novas perspectivas para si e para o país.

43. Em terceiro lugar, porque diferentemente das gerações anteriores, que ao comparar o passado com o presente veem um copo meio cheio, as novas gerações, que tem toda uma vida pela frente, enxergam um copo meio vazio e estão preocupadas em enchê-lo por completo. Tudo isso exige falar sobre o que será feito nos próximos anos para atender estes anseios.

44. Em quarto lugar, e principalmente, porque para ter os recursos necessários para atender as novas demandas, é preciso realizar reformas estruturais, que só serão politicamente viáveis se tivermos força para isto, e construir esta força inclui ganhar a eleição e o apoio do povo às reformas estruturais.

45. Por tudo isto, insistimos mais uma vez: nesta eleição de 2014, o Partido dos Trabalhadores tem como objetivo não apenas vencer as eleições presidenciais, elegendo a presidenta Dilma Rousseff para um segundo mandato presidencial, mas também vencer criando as condições para um segundo mandato superior, melhor, mais avançado do que o atual.

46. Apesar de ter estabelecido este objetivo (vencer criando as condições para um segundo mandato Dilma superior), o Partido dos Trabalhadores ainda não conseguiu transformar este objetivo em diretrizes programáticas claras. Isto fica claro da leitura das resoluções do 14º encontro nacional do PT. Fica claro, também, tanto nas coincidências quanto nas discrepâncias dos discursos feitos por Rui Falcão, Lula e Dilma Rousseff na Convenção de 21 de junho.

47. Em nossa opinião, o programa de governo 2015-2018 deveria partir do reconhecimento efetivo, não apenas retórico, de que continua posta a tarefa de superar a herança maldita proveniente da ditadura, do desenvolvimentismo conservador e da devastação neoliberal.

48. Esta herança possui três dimensões principais: o domínio imperial norte-americano, a ditadura do capital financeiro e monopolista sobre a economia, e a lógica do Estado mínimo.

49. Superar estas três dimensões da herança maldita é uma tarefa simultaneamente nacional e internacional, motivo pelo qual devemos defender e aprofundar a soberania nacional, acelerar e radicalizar a integração latino-americana e caribenha, com uma política externa que confronte os interesses dos Estados Unidos e seus aliados.

50. As quase três décadas perdidas (metade dos anos 1970, anos 1980 e 1990) produziram uma tragédia que começou a ser debelada, nas duas gestões do presidente Lula e na primeira gestão da presidenta Dilma.

51. Mas para continuar democratizando o país, ampliando o bem-estar social e trilhando um caminho democrático-popular de desenvolvimento, será necessário combinar ampliação da democratização política e políticas públicas universalizantes do bem estar-social, com um padrão de desenvolvimento ancorado em reformas estruturais: a reforma tributária, a reforma do setor financeiro, a reforma urbana, a reforma agrária, a universalização das políticas sociais, a reforma política e a democratização da comunicação.

52. Ou seja, precisaremos libertar a economia e a sociedade brasileira de um padrão de desenvolvimento econômico que prevaleceu não apenas durante o neoliberalismo, mas ao longo de muitas décadas. Se não conseguirmos fazer isto, se não conseguirmos mudar o padrão de desenvolvimento, sofreremos uma derrota estratégica, não importa qual seja o resultado das eleições.

53. Os militantes da Articulação de Esquerda, especialmente os nossos candidatos e candidatas, devem fazer uma campanha eleitoral que combine a defesa das candidaturas petistas, com a defesa das reformas estruturais indispensáveis a um segundo mandato superior.

54. Aos 50 anos do golpe militar, o conjunto da esquerda brasileira deve estar consciente de que as eleições de 2014 ocorrem num ambiente marcado pelo confronto entre, de um lado, a direita (social, política, “midiática”), cada vez mais feroz e histérica; e, de outro lado, as forças políticas que defendem a versão moderna das “reformas de base”. Este confronto — muito mais que um jogo, uma Copa ou uma Olimpíada — é que decidirá o futuro do Brasil. E que, por tabela, incidirá fortemente no futuro da América Latina e do Caribe.

Direção Nacional da tendência petista Articulação de Esquerda
Brasília, 21 de junho de 2014


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