terça-feira, 24 de fevereiro de 2015
A construção do Partido dos Trabalhadores
Projeto de resolução para debate e deliberação no Segundo Congresso da tendência petista Articulação de Esquerda.
O segundo congresso da tendência petista Articulação de Esquerda será realizado no Instituto Cajamar (SP), de 2 a 4 de abril de 2015. Simultaneamente, ocorrerá a Conferência sindical da tendência.
A pauta do segundo congresso da AE inclui os seguintes pontos: 1) balanço das eleições 2014; 2) desafios e propostas para o segundo mandato Dilma Rousseff, para a luta social, para a comunicação e cultura, para os governos/parlamentos estaduais e municipais, para as eleições 2016 e 2018; 3) nossas propostas de reforma programática, estratégica e organizativa do Partido dos Trabalhadores; 4) atuação e organização da Articulação de Esquerda; 5) eleição da nova Direção Nacional da Articulação de Esquerda e da Comissão de Ética Nacional
O ponto denominado “atuação e organização da Articulação de Esquerda”, inclui os seguintes itens: 1) A construção do Partido dos Trabalhadores, onde apresentamos nossa visão sobre como enfrentar os desafios postos atualmente para o PT; 2) A tendência petista Articulação de Esquerda, onde apresentamos as posições fundamentais que definem nossa tendência; ; 3) A trajetória da tendência petista Articulação de Esquerda, onde apresentamos nossa versão sobre a história da AE; 4) Regimento da tendência petista Articulação de Esquerda, que define nossas normas de funcionamento; 5) Plano de trabalho para a direção eleita no Segundo Congresso da AE.
O presente texto versa sobre A construção do Partido dos Trabalhadores.
A construção do Partido dos Trabalhadores
1. A experiência histórica, tanto nacional quanto internacional, vem demonstrando que a continuidade do capitalismo implica em sofrimentos cada vez mais intensos e em crises cada vez mais perigosas para a imensa maioria da população de nosso planeta.
2. Por outro lado, este mesmo capitalismo criou as bases para a construção de outro tipo de sociedade, uma sociedade comunista, ou seja, baseada na produção coletiva e na propriedade social dos meios de produção, uma sociedade onde os trabalhadores e as trabalhadoras decidam democraticamente o quê produzir, como produzir e como distribuir as riquezas, superando a opressão e a exploração presentes onde existe a divisão da sociedade em classes, bem como criando as condições sociais indispensáveis à superação de outras formas de opressão e exploração.
3. A experiência histórica também demonstrou as imensas dificuldades e riscos que se colocam para aqueles que pretendem superar o capitalismo e realizar a transição socialista em direção a uma sociedade comunista. Por isto, devemos combinar de forma permanente a luta contra o capitalismo com o estudo do capitalismo, a luta pelo socialismo com o estudo das tentativas de construção do socialismo.
4. Deste estudo, há três ideias que se destacam. A primeira delas é que a superação do capitalismo depende da luta das classes trabalhadoras. A segunda delas é que, existindo as necessárias condições objetivas, o êxito desta luta depende fundamentalmente do grau de consciência, organização e mobilização da classe trabalhadora assalariada – ou seja, daquela classe que é diretamente explorada pelos capitalistas. A terceira é que a luta socialista supõe diferentes formas de organização, de luta e de mobilização, bem como diferentes estratégias, táticas e políticas de aliança; mas sempre exige a presença do partido político.
5. A experiência demonstra, ainda, que em diferentes épocas e contextos históricos, houve diferentes tipos de partidos políticos. Desde as revoluções burguesas até a época da Associação Internacional dos Trabalhadores, desde a Comuna de Paris até a chamada Segunda Internacional, desde a Revolução Russa de 1917 até a Chinesa de 1949, desde a vitória da Revolução Cubana de 1959 até a derrota das guerrilhas latino-americanas, passando pelas guerras de libertação em África e Ásia, pelas experiências anarquistas, nacionalistas, populistas, social-democratas e comunistas, a classe trabalhadora construiu variados tipos de partidos, que algumas vezes entraram em confronto, mas também fizeram alianças entre si.
6. Desta larga experiência, que também deve ser objeto de permanente reflexão, extraímos duas grandes lições. A primeira, já referida: o sucesso da luta contra o capitalismo e pelo socialismo exige que a classe trabalhadora se organize de diversas formas, entre as quais o partido político. A segunda: é a prática concreta que define o papel que um partido joga em cada circunstância histórica. Entendemos por “prática concreta” a ideologia, a teoria, a estratégia, as táticas, as formas organizativas e principalmente o vínculo com a classe trabalhadora realmente existente.
7. Nenhum partido nasce pronto e acabado, nenhum partido tem o monopólio da classe, nenhum partido é eterno. Mas sem partido, a luta da classe trabalhadora será claudicante, mais facilmente sujeita à derrotas táticas e de antemão derrotada estrategicamente.
8. A história dos partidos da classe trabalhadora brasileira possui cerca de 100 anos. Inclui os anarquistas, os socialistas, assim como setores vinculados à tradição democrático-radical, nacionalista, cristã e sindicalista. Nesta história, destacam-se o trabalhismo, o comunismo e o petismo.
9. Desde o final da ditadura militar até os dias atuais, o Partido dos Trabalhadores é o partido com maior influência nas classes trabalhadoras brasileiras, com mais força política social e institucional, com mais destaque internacional.
10. Os demais partidos vinculados à classe trabalhadora são aliados, adversários ou inimigos do PT, mas o fato de sua ação política girar em torno do PT confirma que na atual fase da história brasileira o petismo mantém hegemonia sobre a esquerda brasileira, hegemonia que decorre de sua influência de massa e também das condições sob as quais se trava, hoje, a luta política no Brasil.
11. O Partido dos Trabalhadores foi criado em 1980. Sofreu diversas transformações ao longo de sua trajetória de 35 anos. Estas transformações responderam em parte às mudanças objetivas ocorridas na sociedade brasileira, na luta entre as classes sociais. Por outra parte, as mudanças sofridas pelo PT são produto da luta entre as diversas correntes existentes no interior do Partido, correntes que expressam de maneira mais ou menos consciente o ponto de vista de diferentes setores da classe trabalhadora.
12. Existem no PT quatro grandes correntes ideológicas: o social-liberalismo, o desenvolvimentismo, a social-democracia e o socialismo.
13. Os socialistas são aqueles que defendem superar o capitalismo brasileiro, através da combinação entre as reformas estruturais democrático-populares e um cada vez mais intenso controle social da produção, da riqueza e do poder. Defensores desta posição encontram-se espalhados na base partidária e em diversas tendências, especialmente na chamada esquerda petista.
14. Os social-democratas são aqueles que acreditam ser possível transformar o capitalismo brasileiro, ao ponto dele ser compatível com a ampliação sustentada da democracia, da soberania nacional e do bem-estar social, tendo como horizonte histórico o chamado estado de bem-estar social, existente por algum tempo na Europa após a Segunda Guerra Mundial. As expressões mais conhecidas desta corrente militam nas tendências Mensagem ao Partido e Construindo um Novo Brasil.
15. Os desenvolvimentistas são aqueles que defendem que o Partido assuma como seu programa máximo o desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Vitoriosa esta tese, o PT deixaria de ser o partido dos trabalhadores e se converteria num partido dos “setores médios”. Dilma Rousseff é sua expressão mais conhecida.
16. Os social-liberais são aqueles que buscam conciliar as politicas sociais distributivas com a lógica econômica neoliberal. Antonio Pallocci é sua expressão mais conhecida.
17. Entre 1995 e 2015, a maior parte das direções do PT e de seus representantes sociais, institucionais e ideológicos, foi e é proveniente das correntes social-democrata, desenvolvimentista e social-liberal.
18. Desde 1995, mas especialmente desde 2005, os socialistas vêm perdendo influência no Partido dos Trabalhadores.
19. A maior parte dos petistas socialistas sofreu uma metamorfose, aderindo em maior ou menor grau às ideias das demais correntes ideológicas.
20. Outra parte desistiu de construir o PT, optando por investir suas energias na militância dita “social” ou explicitamente em outros projetos partidários.
21. Um grande número escolheu manter-se filiado ao PT, mas sem acreditar na possibilidade de reconstruir uma hegemonia socialista no seu interior.
22. Nestas condições, cabe responder por quais motivos a Articulação de Esquerda continua petista e continua disputando os rumos do PT.
23. Nossa resposta é no fundamental a seguinte: os dilemas do PT são os dilemas da classe trabalhadora brasileira. Nas atuais condições históricas, a derrota do PT será a derrota do conjunto da classe trabalhadora brasileira.
24. Os que acreditam que esta derrota é inevitável e investem na construção de uma alternativa partidária, geralmente acreditam que esta alternativa sobreviverá à derrota do PT e assumirá o papel atualmente ocupado pelo PT. Consideramos que esta crença é, simultaneamente, uma ilusão e uma tragédia. É uma ilusão porque caso o PT fosse derrotado historicamente, o mais provável seria ocorrer algo similar ao que se passou em 1964-1980. É uma tragédia, porque não temos nunca o direito de agir como se fosse inevitável a derrota da nossa classe.
25. Noutros termos, continuamos petistas e continuamos disputando os rumos do PT, porque consideramos necessário e possível impedir a derrota da atual experiência política da classe trabalhadora brasileira. E isto passa por impedir a derrota do PT. E impedir a derrota do PT exige, fundamentalmente, mudar a atual estratégia partidária.
26. A política adotada pelo PT em sua primeira década de existência, especialmente a partir do 5º Encontro Nacional (1986), foi baseada no programa democrático-popular e socialista e numa estratégia que articulava luta social, luta institucional, disputa politico-cultural e organização partidária.
27. Entretanto, depois da derrota sofrida nas eleições de 1989, um setor importante do Partido entendeu que era necessário mudar de programa e de estratégia.
28. Houve resistências e uma intensa luta interna entre 1990 e 1995. A partir de então e até 2005, houve uma expressiva maioria no Diretório Nacional e nos diretórios estaduais a favor de um novo programa e de uma nova estratégia.
29. A partir de 1995, o objetivo programático do Partido, que até então era derrotar o capitalismo e construir o socialismo, foi colocado (de fato) em segundo plano. O objetivo programático do Partido passou a ser (de fato) derrotar o neoliberalismo, o que implicava não mais iniciar uma transição socialista mas sim administrar um capitalismo não-neoliberal.
30. Isso significou, na prática, que embora o socialismo tenha continuado de direito nosso objetivo programático, foi convertido num “horizonte”, que como já se disse, se afasta na exata proporção em que dele nos aproximamos. E como o caminho é longo e cheio de pedras, ao perseguir este horizonte inatingível alguns começaram a dizer que o socialismo na verdade seria democracia + bem estar social + economia de mercado.
31. À medida que o objetivo programático passou a ser derrotar o neoliberalismo, setores do grande capital passaram a ser considerados aliados estratégicos. Em função disto, passamos a realizar cada vez mais alianças com partidos de centro e direita, que expressavam exatamente os interesses daqueles setores da burguesia.
32. Como o grande capital brasileiro é hegemonizado pelo setor financeiro e monopolista, setores do Partido passaram a defender e a praticar alianças com estes setores, ou seja, exatamente com os setores beneficiários e interessados no neoliberalismo que supostamente se pretendia derrotar. E, em consequência disto, começaram a propor e a realizar alianças inclusive com o PSDB.
33. A mudança no objetivo programático e nas alianças foi acompanhada por mudanças na política de acúmulo de forças e de conquista/construção do poder.
34. Até 1995, nosso caminho para o poder incluía participar das eleições e exercer mandatos. Mas a luta institucional era um dos meios, não o único meio e nunca o fim. A luta institucional era considerada parte de uma estratégia que incluía também a luta e organização social, a construção de uma aliança orgânica entre as forças democrático-populares, a disputa ideológica, cultural, de visões de mundo, bem como a organização do próprio PT como partido de massas.
35. Mas ao longo dos anos 1990, especialmente a partir de 1995, a luta institucional foi progressivamente se tornando “a” estratégia, que subordinava e na prática às vezes substituía os demais aspectos.
36. A mudança no objetivo programático, na política de alianças, na política de acúmulo de forças, na via de conquista/construção do poder não impediram a nossa vitória nas eleições presidenciais de 2002. Aquelas mudanças estratégicas tampouco impediram que nossos governos federais, estaduais e municipais melhorassem a vida do povo.
37. Mas com o passar do tempo foi ficando cada vez mais claro que a estratégia adotada entre 1995 e 2005, além de não conduzir ao socialismo, possuía também “defeitos de fabricação” que impediam atingir seus próprios objetivos.
38. Afinal, para continuar melhorando a vida do povo, ampliando a democracia e a soberania nacional, é preciso fazer reformas estruturais. Na ausência de reformas estruturais, a tendência é o retrocesso nas condições de vida do povo e a retomada de uma hegemonia de tipo neoliberal.
39. E para fazer reformas estruturais, necessitamos de força política e social, já que tais reformas de caráter democrático-popular contrariarão os interesses das classes dominantes no plano nacional e internacional.
40. Por outro lado, chegamos ao governo, mas não conquistamos o poder. E aqueles setores políticos e sociais que detêm o poder estão cada vez mais ameaçando nossa continuidade no governo, como fica claro ao compararmos os resultados das eleições presidenciais desde 2002 até 2014.
41. Acontece que a estratégia adotada pelo PT desde 1995 visava e visa conquistar o governo e mudar as ações de governo. Não é e nunca foi uma estratégia de poder, de disputa de hegemonia e ampliação do apoio político e social para o Partido, de reformas estruturais. Por isto, seguir adotando esta estratégia nos levará, na prática, inapelavelmente, a administrar o retrocesso do que fizemos desde 2002 e ajudar em nossa própria derrota, nas eleições e/ou fora delas.
42. Noutra palavras: a estratégia majoritária no PT entre 1995 e 2005 nos trouxe até certo ponto. Talvez pudéssemos ter chegado até aqui com outra estratégia, talvez não. Independentemente disto, para seguir adiante o Partido precisa de outra estratégia.
43. Uma estratégia que reconheça que só é possível continuar melhorando a vida do povo se fizermos reformas estruturais. Que construa as condições políticas para fazer reformas estruturais. Que recoloque o socialismo como objetivo estratégico. Que constate que o grande capital é nosso inimigo estratégico. Que não acredite nos partidos de centro-direita como aliados. Que seja baseada na articulação entre luta social, luta institucional, luta cultural e organização partidária. Que retome a necessidade do partido dirigente e da organização do campo democrático-popular.
44. Em 2005 já havia ficado clara a necessidade desta nova estratégia. Naquele momento, a crise política criou as condições para eleger uma nova direção para o Partido, entendendo direção no duplo sentido da palavra: no sentido de núcleo dirigente e no sentido de rumo estratégico.
45. Entretanto, entre o primeiro e o segundo turno das eleições partidárias de 2005, um importante setor da esquerda petista desistiu de disputar o PT e resolver aderir ao PSOL.
46. Em parte por isto, em parte por limitações dos demais setores da esquerda petista, em parte pela força dos demais setores do PT, o resultado foi a eleição de uma nova direção partidária comprometida com algumas mudanças na implementação da estratégia, mas não comprometida com a adoção de uma nova estratégia.
47. Embora limitadas, as mudanças realizadas entre 2006 e 2010 melhoraram o ambiente no Partido, contribuíram para que o governo Lula fizesse uma inflexão à esquerda e nos permitiram vencer as eleições presidenciais de 2006 e 2010. Mas a estratégia continuou a mesma. Aliás, alguns setores (inclusive da esquerda petista) interpretaram os resultados positivos da inflexão iniciada em 2005 como demonstração de que não era necessário mudar de estratégia.
48. As consequências deste erro ficaram claras em junho de 2013, nas eleições de 2014 e neste início do segundo mandato de Dilma. Ao não mudar a estratégia, enfrentamos seus efeitos colaterais. Ao não mudar a estratégia no momento adequado, somos obrigados a tentar a alteração quando é mais difícil fazê-lo.
49. Portanto, embora o estilo predominante no atual governo possa agravar as coisas, os impasses estratégicos atuais não decorrem principalmente das ações (e inações) da presidenta Dilma. As escolhas estratégicas feitas pelos grupos atualmente majoritários no PT são anteriores ao ingresso de Dilma no Partido. E as opções feitas pelo governo neste primeiro bimestre de 2015 têm a mesma genética das opções feitas por Lula no biênio 2003-2004.
50. A diferença é que as condições da luta de classe mudaram completamente. O cenário internacional foi alterado, o grande capital mudou de atitude, os setores médios e parcelas crescentes da classe trabalhadora também mudaram sua atitude frente ao nosso PT e aos governos que encabeçamos. Ou seja: se é verdade que a atual estratégia oferecia seus ônus e seus bônus, agora os bônus estão desaparecendo e os ônus agigantaram-se.
51. A Articulação de Esquerda não tem a pretensão de construir sozinha uma saída para a situação. Não temos influência interna e externa, quadros e capacidade para isto. Mas nossa trajetória e nossas reflexões nos autorizam a contribuir na busca desta saída, até porque a leitura de nossas resoluções desde 1993 demonstra que percebemos e tentamos construir alternativas para os problemas que estavam se avolumando.
52. A saída passa por convencer a maioria da classe trabalhadora brasileira, especialmente a maioria dos petistas, da necessidade de sair da situação atual, em que buscamos melhorar as condições de vida do povo nos marcos do capitalismo, para uma nova situação, em que melhoraremos as condições de vida do povo através de reformas estruturais democrático-populares e de medidas de tipo socialista.
53. A saída passa, igualmente, por convencer a maioria da classe e do Partido de que só retomaremos a condição de partido hegemônico no governo, se nos dispusermos a conquistar/construir as condições para sermos partido hegemônico no poder de Estado.
54. Quando defendemos a necessidade de radicalizar, é comum sermos contestados da seguinte forma: a correlação de forças é pior hoje do que em 2003. Se então não radicalizamos, como fazê-lo com êxito nas condições atuais?
55. Nossa resposta é: não desconhecemos as condições difíceis, sabemos os riscos envolvidos e ninguém pode garantir êxito. Mas estamos naquela clássica situação em que uma política recuada é mais arriscada do que uma política ousada. Dito de outra forma: quando nossos inimigos estão recuados, temem a nossa força e estão dispostos a fazer acordos, os acordos podem até trazer alguns benefícios. Mas quando os inimigos estão em plena ofensiva, buscando efetivamente nos liquidar, os acordos e recuos geralmente têm como resultado fortalecê-los ainda mais e facilitar esse objetivo, ao tempo que confundem e desmoralizam nosso lado.
56. Evidentemente, uma política ousada só terá êxito se basear-se nas condições potenciais de mobilização, organização e consciência das classes trabalhadoras. O segundo turno das eleições de 2014 mostrou que é perfeitamente possível sair de armadilhas políticas, convocando a imensa energia social que temos acumulada. E o início do segundo mandato demonstra que desconhecer esta energia acumulada e adotar como regra fazer concessões aos inimigos tem como resultado perder apoios e reforçar ódios (como demonstram recentes pesquisas).
57. Para ter êxito numa política de reformas estruturais e empoderamento político, o PT precisa “fazer o dever de casa”, ou seja, reiterar incansavelmente seu caráter de classe, a necessidade de manter uma relação estreita com os movimentos e lutas sociais, e jamais abandonar ou distorcer seus mecanismos de democracia interna.
58. Estas atitudes são fundamentais para a sobrevivência do PT, seja frente às correntes de ultra-esquerda, que tentam liquidá-lo a pretexto de que o partido abandonou seus ideais, seja frente aos constantes ataques da direita, que procuram liquidá-lo porque tem clareza de que o PT é o principal instrumento que as classes trabalhadoras têm disponível hoje, para a conquista do poder e para a mudança das relações sociais.
59. O PT é um partido de massas, o que significa dizer que em maior ou menor medida ele deve conter em seu interior a diversidade de posições políticas que existe na classe trabalhadora. Isto significa que o PT deve ser aberto à participação de correntes desenvolvimentistas, social-democratas e inclusive social-liberais. Entretanto, devemos travar uma luta constante para que estes setores evoluam para posições democrático-populares e socialistas.
60. Embora praticando táticas eleitorais de alianças com diversos setores sociais e políticos, visando ao enfrentamento contra partidos e representantes da direita neoliberal, o PT precisa combater as atitudes daqueles petistas que procuram utilizar os mesmos métodos e hábitos burgueses desses eventuais aliados.
61. Por isto mesmo, o PT não deve temer fazer autocrítica de seus erros publicamente, nem vacilar em punir exemplarmente aqueles dirigentes e militantes que fizeram uso de métodos burgueses de atuação e, com isso, abriram flancos aos ataques inimigos, causaram prejuízo ao Partido e colocaram sua sobrevivência em risco.
62. Vale dizer que a Articulação de Esquerda, sem cair na demagogia nem nas ilusões republicanas de alguns setores do petismo, sempre defendeu a necessidade do Partido ter autonomia financeira, combatemos a dependência frente às contribuições de empresas privadas, propusemos a criação de uma corregedoria interna (que se antecipasse na descoberta de corruptos infiltrados no Partido), exigimos medidas de auditoria e punição contra a corrupção praticada nos governos tucanos, bem como comissão de ética e as punições cabíveis para os envolvidos na crise de 2005. A maioria partidária fez outras opções e hoje pagamos caro por isto.
63. O processo de construção de um partido dos trabalhadores exige uma constante correção de rumos, através da reafirmação de sua estratégia, da atualização das políticas e táticas, e do aprofundamento da democracia interna, tendo em vista preservar o partido daqueles métodos, hábitos e costumes que ameaçam destruí-lo ou deformá-lo totalmente.
64. Em vista disso, o PT deve redobrar sua capacidade de formulação política, atualizando sua análise de classes da sociedade brasileira, com atenção especial aos deslocamentos ocorridos no interior da classe trabalhadora, a partir da elevação dos padrões de consumo de milhões de pessoas, nos últimos anos. Será necessário um esforço mais efetivo de análise do processo de desenvolvimento capitalista no Brasil, da formação e transformação histórica das classes sociais e da luta entre elas. E de reelaboração e discussão do programa estratégico para o Brasil, incluindo a questão do poder, do papel das diferentes formas de luta que a burguesia pode impor ao povo brasileiro e dos diferentes instrumentos organizativos das classes trabalhadoras.
65. Para preparar-se e tornar-se efetivamente capaz de ser força política hegemônica na sociedade brasileira e conquistar a direção do poder político como um todo, o PT precisa de uma clara hegemonia interna, em torno do programa e da estratégia democrático-popular e socialista, reiterando seu caráter de classe, de massas, de luta e internamente democrático. Deve, ainda, ampliar sua presença institucional e social e revigorar sua vida partidária, com atenção primordial a suas bases organizativas. E superar a prolongada subestimação da formação política de dirigentes e militantes, utilizando tal formação inclusive como primeiro passo para o ingresso no partido e a ocupação de cargos de direção.
66. O PT deve, também, formular e executar uma política de cultura, educação e comunicação de massas, tendo em vista construir uma hegemonia das ideias democráticas, populares e socialistas no meio do povo, hoje vítima de uma violenta ofensiva do ideário conservador.
67. No caso específico da comunicação, trata-se de 1) democratizar a comunicação social; 2) ampliar a rede de meios de comunicação (televisões, rádios, internet e imprensa) dirigidos pelo campo democrático-popular; 3) construir os instrumentos do próprio Partido, com destaque para um jornal diário de massas, que seja o núcleo central de produção do conteúdo que será repercutido através dos demais meios, especialmente das redes sociais.
68. Esta é, portanto, a conduta geral que nós da Articulação de Esquerda adotamos na disputa de rumos do Partido dos Trabalhadores: continuamos trabalhando para que ele assuma um papel de vanguarda, não apenas na luta pelo governo, mas também na luta pelo poder; não apenas na luta pelo desenvolvimento, mas também na luta por reformas estruturais e pelo socialismo.
69. Evidentemente, a disputa pelos rumos do PT se trava em condições muito mais difíceis hoje do que em 1993. Em parte por erros e insuficiências de nossa parte; em parte por erros e insuficiências de outras tendências da antiga esquerda petista; em parte devido a atitudes de outros setores do PT; em parte devido às circunstâncias em que atuamos; é preciso dizer claramente que se torna cada vez mais difícil mudar a estratégia atualmente hegemônica no PT – ainda que, contraditoriamente, a necessidade desta mudança torne-se cada vez mais evidente para muitos segmentos do Partido.
70. Isto gera, em alguns setores da esquerda petista, três atitudes que consideramos totalmente condenáveis.
71. A primeira delas é capitular ao modus operandi dos setores de centro e direita do Partido. A segunda delas é desistir do Partido dos Trabalhadores. A terceira delas é assumir uma atitude de seita, substituindo a disputa política pela reafirmação de posições minoritárias, que não pretendem nunca se tornar majoritárias.
72. A Articulação de Esquerda recusa estas três condutas. Continuamos na disputa do PT, não abrimos mão de nossas posições programáticas e estratégicas, mantemos a flexibilidade tática indispensável para manter posições conquistadas e acumular forças. Mas para que tenhamos alguma chance de êxito, será necessária maior criatividade e consistência ideológica e teórica; maior capacidade de elaboração política; maior força social, especialmente junto às classes trabalhadoras; mais disciplina e centralismo militante por parte da nossa tendência.
73. O segundo congresso da AE retoma a proposta de um Congresso Nacional da Esquerda Socialista do PT, com o objetivo de dar o máximo de visibilidade, coesão política e organicidade para o petismo socialista e revolucionário.
74. Como dissemos antes, não consideramos que a AE seja capaz de dar conta sozinha das imensas tarefas postas diante do PT. Acreditamos que em todas as tendências petistas haja militantes comprometidos com as ideias que defendemos. Estamos dispostos a cooperar com todos e todas neste sentido. Ao mesmo tempo, aprendemos desde 1993 que a existência de uma tendência como a nossa, com todas as suas limitações, é essencial. Por isto, ao mesmo tempo que reafirmamos nossa disposição de marchar juntos com todos aqueles que desejam construir o Partido dos Trabalhadores, reafirmamos também nossa decisão de continuar construindo a tendência petista Articulação de Esquerda.
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